Qualidade de vida faz trabalhador fugir para Campinas na hora de escolher a casa própria

São 92 km e pouco mais de 1h30 de viagem. É o trajeto que o escrevente judiciário Silvio Piovani, de 26 anos, faz diariamente para vir de Sorocaba a São Paulo só para estudar. Ele é um dos milhares que enfrentam estradas em ônibus ou carros e linhas de ferro em trens para aproveitar as oportunidades da capital sem abrir mão da melhor característica das cidades do interior: a qualidade de vida.

Com o valor de casas e apartamentos cada vez maior na cidade de SP, incluindo o aluguel, há quem prefira migrar diariamente para o trabalho ou para a faculdade mesmo morando a centenas de quilômetros de distância.

O preço do metro quadrado quase dobrou entre 2008 e 2011 na capital, segundo o índice FipeZap, desenvolvido e calculado pela Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) a partir dos anúncios de apartamentos prontos do site Zap Imóveis. Neste mês, o valor atingiu R$ 5.313.

Flavio Amary, vice-presidente do Interior do Secovi-SP, afirma que as cidades do interior têm crescido a uma velocidade maior do que a capital há alguns anos. Para ele, há um movimento de descentralização tanto de empresas quanto de faculdades, e isso move o setor imobiliário de cidades como Campinas, Jundiaí, Sorocaba, São José dos Campos, Santos e outras.

– Na comparação entre as cidades do interior, o metro quadrado é parecido, mas se comparado com SP, é muito mais barato. Com o mesmo valor de um apartamento pequeno [de um ou dois quartos] na capital, é possível comprar um de três ou de quatro no interior, ou até uma casa.

Pelas pesquisas mais recentes do Secovi-SP, o preço médio do metro quadrado de um imóvel do segmento econômico (dois quartos) em Sorocaba é de R$ 2.000. Um apartamento maior tinha o metro quadrado avaliado entre R$ 2.400 e R$ 3.400, em 2010. Em Campinas, os preços partiam de R$ 2.300, nos imóveis mais simples, até R$ 4.100 para os maiores.

Só essa diferença já explicaria a migração para a área que os especialistas chamam de macrometrópole – que não engloba só a cidade de São Paulo e a região metropolitana, mas também as cidades dentro do quadrilátero formado por Santos, São José dos Campos, Campinas e Sorocaba. Mas há outras causas, como explica Amary.

– A melhora significativa das estradas tem incentivado a mobilidade. A tecnologia também possibilita que as pessoas morem longe e trabalhem de casa. Os centros universitários se afastam da capital. E a indústria, que antes ia para o Grande ABC [Santo André, São Bernardo e São Caetano], agora vai para o interior. Essas empresas estão procurando as cidades em um raio de 100 km de SP.



Estudo distante

Silvio Piovani, que já é formado em direito, diz que sempre quis estudar na USP (Universidade de São Paulo) e decidiu prestar vestibular para o curso de história em 2009. Aprovado em 2010, surgiu outro problema: como fazer para conciliar o trabalho em um fórum do interior e fazer a segunda faculdade.

– Estava pensando em me transferir, mas teria que esperar. Fiquei alguns meses nessas de morar e trabalhar lá e vir para a capital diariamente. A ideia era trazer a vida toda pra cá de uma vez, mas depois de ficar alguns meses em uma república, eu só penso em voltar. Não importa se tem que pegar estrada ou não.

Ele diz que, além de ter a família e a namorada por perto, morar no interior e viajar nos dias de aula sai mais barato do que viver por aqui.

– É uma matemática simples: gastava uma média de R$ 1.000 com vindas de carro, três ou quatro dias por semana. Morando aqui, pago aluguel, combustível, alimentação, visita de volta para Sorocaba no fim de semana, pedágio e outros que fazem o gasto ser um pouco maior. Não é muito, mas gasto mais do que o ritmo só de ida e volta.

Condomínio clube

Maria Lucia Refinetti Martins, professora de planejamento urbano e regional da FAU (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo), da USP, diz que essa macrometrópole tende a funcionar cada vez mais como uma coisa só, com as cidades interligadas. Hoje, 3 em cada 4 habitantes do Estado moram em alguma das cidades dessa área.

– O entorno da metrópole concentra cada vez mais os lançamentos imobiliários. O terreno de SP é muito mais caro [do que no passado]. O setor popular tem sido despachado desde sempre para as periferias, e obrigado a usar o ônibus ou o trem. Na classe média, esse movimento de afastamento do centro tem mais a ver com o chamado condomínio clube.

Para ela, é o discurso da segurança e da qualidade de vida por causa da proximidade com a natureza fizeram cidades da Grande SP virarem grandes aglomerados de condomínios. O mais famoso caso é o do bairro de Alphaville, que fica entre as cidade de Barueri e a cidade Santana de Parnaíba.

O que acontece agora é que a região metropolitana já não é mais o limite. A especialista diz que tem na família dois casos de quem mora longe e viaja para trabalhar. “Tenho uma filha que mora em Santos e outra em Jundiaí”, afirma Maria Lucia.

– É um movimento grande, sem dúvida, de pessoas indo para o interior. O bom seria que em vez de concentrar, tivesse movimento em todas as direções, com opções de trabalho e de estudo em outros centros.

Fonte: R7





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